Entrevista | Mónica Schlotthauer: do Congresso à ferrovia Sarmiento

Entrevista Jornal El Socialista Tradução e Revisão Bianca Damacena

 

Em dezembro, Mónica Schlotthauer terminou seu mandato como deputada nacional pelo partido Izquierda Socialista na Frente de Esquerda Unidade. O fato de que ela havia voltado ao seu local de trabalho como faxineira na estação ferroviária Sarmiento, depois da sua passagem pelo Congresso Nacional da Argentina, teve grande repercussão.

Foto: Manuel Cortina/LA NACION

Mónica é parte do corpo de delegados da ferrovia Sarmiento, liderados por Rubén “Pollo” Sobrero, e também é parte do coletivo Mulher Bonita é a que Luta, e da Casa que Abraça, que constrói com suas companheiras. A volta de Mónica ao seu trabalho teve repercussão positiva e foi vista como um exemplo de coerência e honestidade. O jornal El Socialista entrevistou a companheira Schlotthauer.

Como foi voltar às suas tarefas cotidianas?

MS Estive de licença pelas tarefas políticas que realizei, primeiro na legislatura da província de Buenos Aires e, no último ano, no Congresso Nacional. Incorporei-me novamente no sábado passado e no ano que vem volto ao Congresso ao lado de Juan Carlos Giordano, onde voltaremos a ocupar a vaga, pelo Izquierda Socialista, por causa da rotação que se faz na Frente de Esquerda. Foi bom voltar a compartilhar debates com meus companheiros de trabalho, passageiros e vendedores que não via cotidianamente. São eles que me enchem de ânimo para voltar com mais força ano que vem ao Congresso e defender nossos interesses. E dão energias para encarar todas as lutas que temos que travar agora na ferrovia, pelo aumento salarial e na defesa dos nossos direitos.

Como te receberam suas companheiras de trabalho?

MS Me receberam muito bem, contentes e surpresas. Já começamos a trabalhar juntas e organizamos a primeira visita ao Ministério de Mulheres, Gênero e Diversidade para levar as reivindicações das ferroviárias. Também começamos a elaborar um protocolo de segurança para trabalhos com companheiros. Aqui se respira companheirismo e se repudiam as injustiças, tudo ao contrário do que acontece no Congresso onde não escutam nada. Quando uma fala, os outros estão jogando no celular ou gritam de suas mesas para te calar. Por isso prefiro chegar aqui onde me recebem com mate e sorrisos.

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Por que acha que se difundiu tanto a notícia nas redes sociais e nos jornais?

MS Porque demonstra a bronca que os trabalhadores e setores populares têm contra os políticos patronais. A FIT-Unidade é diferente dos legisladores do PJ, PRO e da UCR, que passam décadas confinados em seus mandatos no Congresso, nós mudamos e voltamos a nossos lugares de trabalho. Exercer um cargo de deputada e ocupar um posto de trabalho na ferrovia é parte da minha militância em defesa dos trabalhadores e pelo socialismo.

Foto: Manuel Cortina/LA NACION

Que balanço você faz da sua passagem no Congresso?

MS Como experiência há uma parte linda, porque aprendi bastante e levei as propostas do Izquierda Socialista e da Frente de Esquerda Unidade para cada tema. Votamos sempre contra as reduções de orçamento, contra o pagamento da dívida externa e explicando porque é preciso romper com o FMI. Sempre apresentei uma saída concreta para os trabalhadores e setores populares. Apresentamos vários projetos, entre eles, uma lei que proíbe demissões e suspensões, a nacionalização do sistema educativo e contra a mineração. Além disso, estivemos presentes nas lutas. Mostramos que a FIT-Unidade dá resposta aos problemas do povo trabalhador. O pior é que depois não se chega nem sequer a discutir porque são propostas contra os poderosos que dominam o Congresso. Porém, é lindo poder estudar para elaborar essas soluções. Claro, depois éramos Nicolás del Caño, Romina del Plá e eu, somente três mandatos da esquerda contra centenas que votavam contra os trabalhadores.

Como os outros deputados te trataram?

MS Quando você faz o juramento todos te saúdam, aplaudem e felicitam. Até que eles vêem o que dizemos, como denunciamos os golpes e os acordos que existem entre os partidos patronais. Quando te escutam falar, acabou, aí deixam de te cumprimetar e nem usam o mesmo elevador contigo, entre outras várias coisas indignantes. Termina a diplomacia, porém não vamos esperar que beijem nossas mãos. O Congresso é uma caverna de ladrões e vamos denunciar esse rol de ajustadores que estão ali.

Como é a política da Frente de Esquerda a respeito dos salários de um parlamentar?

MS Nós mantemos nossa média salarial de trabalhador; é por isso que lutamos e acreditamos que cada legislador deveria ganhar. É uma tradição da corrente morenista à qual pertenço. Eu mantive o salário que ganhava na ferrovia estando na Câmara, o resto doava para as lutas em curso e para a construção do meu partido. Somos um partido de trabalhadores e o que dizemos nas campanhas cumprimos.

Nem bancos, multinacionais, nem empresas nos financiam. Tampouco o dinheiro do narcotráfico e da corrupção. Isso nos faz totalmente independentes para denunciar e dizer com autoridade quem são os responsáveis pela crise que atravessa o país.

Foto: Câmara dos Deputados da Argentina/Reprodução

Como uma trabalhadora da limpeza chegou a ser deputada?

MS Há um discurso um pouco pró patronal, que se pergunta: “como uma varredeira chegou a ser deputada?”. Não entendem que a verdadeira política consiste na defesa do interesse de determinado setor. Como militante socialista e lutadora em defesa de meus companheiros, tenho definições importantes sobre o que devemos fazer para melhorar nossas vidas. Por isso não importa se sou varredeira, soldadora, professora ou trabalhadora da indústria têxtil, qualquer companheiro, independente da sua profissão, se é um lutador de sua classe, pode ocupar um lugar no parlamento. E tenho a certeza que para a nossa classe, o parlamento será muito melhor que com os doutores e diplomados que estavam a serviço dos patrões. Temos nos esforçado para que os trabalhadores atuem na política. No caso do nosso partido, temos uma equipe de companheiros que nos ajuda na defesa de uma política a serviço dos interesses da classe trabalhadora. E mais, nós, os trabalhadores, temos o objetivo de governar, somente assim será possível sair da profunda crise de que padecemos.

Quais são os desafios que estão por vir?

MS  Agora é preciso lutar contra o congelamento dos salários e os ajustes do novo governo peronista de Fernández. Contra o pagamento da dívida e pelo rompimento com o FMI. É a única saída concreta para os males que vive hoje o país. Também, há um sistema ferroviário que se encolheu no país e que no ano passado teve um índice histórico de 200 descarrilamentos. Em Sarmiento, a Lobos e a Mercedes diminuíram os serviços. Seguiremos lutando por um trem a serviço dos trabalhadores e não para a ganância das multinacionais. Por isso, reivindicamos a estatização de todo o sistema ferroviário, em que a carga pode subsidiar os passageiros. Com estas reivindicações, queremos avançar na coordenação e fortalecer o sindicalismo combativo. Meu objetivo foi e será impulsionar a luta e as demandas do povo trabalhador, para conquistar nossos direitos: seja com o mandato no Congresso ou no meu local de trabalho, porém sempre na mesma trincheira.


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