Bolsonaro quer condenar a classe trabalhadora à morte, por vírus ou fome

Editorial do Boletim eletrônico do jornal Combate Socialista

Após uma política de negacionismo frente ao coronavírus, desdenhando da gravidade da pandemia e dos esforços para garantir o máximo possível de isolamento entre as pessoas, o governo Bolsonaro anunciou como solução para crise econômica, medidas para esmagar as condições de vida e renda da classe trabalhadora. No auge desse pacote, Bolsonaro anunciou a Medida Provisória 927, que autorizava empresas a suspenderem contratos com os trabalhadores por quatro meses (23/3). 

Diante da repercussão negativa da medida, o ministro Paulo Guedes saiu com a desculpa que “houve um erro na redação” na MP. Pelo twitter, Bolsonaro anunciou “a revogação do art.18 da MP 927, que permitia a suspensão do contrato de trabalho por até 4 meses sem salário”, admitindo que era esse o teor da medida. Mais cedo, o presidente havia dito que a MP resguardava “ajuda possível para os empregados”, mas nada disso estava escrito no texto da Medida Provisória. O governo lançou a MP 927 e foi obrigado a recuar de seu item mais gritante devido à estridência dos protestos nas mídias sociais. 

O recuo do governo acerca do artigo 18, não modifica o caráter empresarial e antipopular dos demais itens previstos na MP. O texto prevê a suspensão do pagamento de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) pelas empresas, ampliando a vulnerabilidade do trabalhador em caso de demissão. A medida ainda permite a superexploração dos trabalhadores após a amenização da crise, com imposição de banco de horas, férias coletivas e antecipação de feriados. Para os trabalhadores informais, a grande maioria em subempregos que dependem da circulação de pessoas e mercadorias, o governo teve o cinismo de anunciar uma ajuda mensal no valor de R$ 200, menos de 1/5 do valor do salário mínimo, um valor miserável e vexatório.

Enquanto o governo monta uma artilharia de guerra genocida contra a classe trabalhadora, em meio à pandemia, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), articula no Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para reduzir os salários dos servidores públicos. A medida conta com o apoio desavergonhado da grande imprensa, como se percebe no editorial do jornal O Globo cujo título afirma que o “Funcionalismo tem de dar a sua contribuição”. Diante da crise provocada pelo Covid-19, a política do governo federal e do parlamento é estrangular ainda mais a renda e os direitos da classe trabalhadora, numa tentativa desesperada e criminosa de salvar os lucros.

Os lucros acima da vida

Banqueiros, planos de saúde e grandes empresas de forma geral são a prioridade máxima e única das ajudas e facilitações impulsionadas pelo governo Bolsonaro. O Banco Central (BC) anunciou para o final desse mês uma nova liberação de recursos para os bancos. O objetivo do BC é injetar R$ 1,216 trilhão no mercado financeiro, partindo da liberação de R$ 68 bilhões através da redução da alíquota de pagamento compulsórios para os bancos. Com esses bilhões a mais, bancos e instituições financeiras terão mais lastro para conceder empréstimos, lucrando com o endividamento das famílias durante a pandemia de coronavírus. Essa política de ajuda aos bancos não é sequer condicionada a alguma contrapartida em favor dos correntistas. Os banqueiros se preparam para fazer da catastrófica crise sanitária uma oportunidade de potencializar seus lucros, gerando um cenário completamente distópico. O cínico editorial de O Globo exige que os servidores deem sua “contribuição” enquanto os opulentos acionistas dos bancos atravessam a quarentena do alto de suas mansões, sítios e coberturas, com todo tipo de luxo e regalias.

Na sexta-feira (20), o BC comprou US$ 3 bilhões em títulos de dívida externa de instituições financeiras nacionais nesta sexta-feira, abastecendo o caixa dos bancos. Valores vultosos que deveriam ser retidos e direcionados ao investimento na saúde pública, para garantia de renda e assistência à população, mas são destinados ao jogo sujo de endividamento da população para que os bancos sigam obtendo lucros recordes mesmo diante de uma crise mundial tão profunda.

Mais dinheiro para o SUS e menos para os planos de saúde

Em 2019, o orçamento da saúde pública sofreu uma redução na ordem de R$ 20 bilhões como resultado da aplicação da Emenda Constitucional do Teto de Gastos. As verbas destinadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) sofreram esse debacle, apesar da receita da União ter crescido 27% desde que a Emenda entrou em vigor. Esse valor a mais recolhido pela União foi destinado ao pagamento de juros e amortizações de uma dívida pública que, ironicamente, só cresce, mesmo com tantos recursos sendo realocados à sua quitação. 

Se em 2019, o governo aplicasse o mesmo percentual que destinou em 2017, 15% da receita corrente líquida, a saúde receberia um orçamento de cerca de R$ 142,8 bilhões. Em 2019, R$ 122,6 bilhões foram destinados à saúde, um encolhimento de R$ 20,19 bilhões. O resultado dessa política tem sido uma asfixia da rede SUS, com falta de pessoal, de equipamentos de proteção individual (EPI), de insumos, remédios, o que em 2020 prejudica decisivamente o combate ao coronavírus. Vale frisar que a Emenda Constitucional do Teto de Gastos, enviada pelo governo Temer, contou com o voto favorável de Bolsonaro quando deputado.

Enquanto a verba da saúde pública é encurtada, o governo Bolsonaro não hesitou em liberar R$ 10 bilhões aos planos de saúde. A ideologia ultraliberal de Guedes e Bolsonaro, com uma fantasiosa autorregulação da economia, demonstra-se uma farsa quando os planos de saúde se escoram no dinheiro público, sem nenhuma compensação ao contribuinte, enquanto o SUS é sucateado. No modelo ultraliberal, quando o lucro dos grandes empresários falha, eles correm pelo socorro do estado. Em plena crise sanitária, os recursos públicos são sugados pela rede privada, prejudicando toda população que não tem acesso aos planos de saúde, em especial os mais pobres e vulneráveis.

Para derrotar o coronavírus é urgente suspender o pagamento da dívida pública

Para combater o coronavírus são necessários robustos investimentos em saúde pública, saneamento, instituições de pesquisa e garantir direitos sociais. Hoje em nosso país, de acordo com a Auditoria Cidadã da Dívida, os gastos do orçamento da União com juros e amortizações das dívidas interna e externa consomem mais de R$ 1 trilhão do orçamento público federal, quase metade dos recursos públicos. Trata-se do maior gasto do Tesouro Nacional, destinando cerca de R$ 2,8 bilhões diariamente ao sistema financeiro, em prejuízo às áreas sociais. A proposta de recursos extras para o Ministério da Saúde está na ordem de R$ 5 bilhões, valor que os bancos e fundos de pensão, maiores detentores de títulos da dívida pública, auferem em menos de dois dias completos. 

Importante refletir: para os bancos e fundos de pensão, através do mecanismo da dívida, foram destinados no ano passado cerca de R$ 1 trilhão, quase 40% do orçamento federal. Já para a totalidade de investimentos em saúde pública foram destinados apenas 4% do orçamento, para a Ciência e Tecnologia (essenciais no combate ao Covid-19) somente 0,23% e para o saneamento 0,02%.  Em 2020, o orçamento prevê o repasse de 408 bilhões exclusivamente ao pagamento de juros aos agiotas do sistema financeiro. 

Desse modo fica explícito que os bancos não necessitam de ainda mais aportes de recursos por parte do governo. O verdadeiro ajuste fiscal que deveria ser feito é sobre o sistema financeiro, valorizando diretos sociais, saúde pública gratuita e a vida. O momento exige preservar a vida do povo trabalhador e não a perpetuação dos lucros e da ganância dos banqueiros. 

Defendemos a suspensão imediata do pagamento de juros e amortizações da dívida pública. Essa medida representa retirar dos que mais lucram – os banqueiros – para com urgência destinar recursos à saúde, à assistência social, à renda dos trabalhadores; assim garantir a sobrevivência dos mais vulneráveis e o combate efetivo à pandemia do coronavírus. Essa bandeira precisa ser abraçada com centralidade pela CUT e demais centrais, federações, confederações, sindicatos, pela UNE, DCEs, e demais movimentos, tal como já defende a CSP-Conlutas. É preciso fortalecer a campanha pela suspensão do pagamento da dívida que é impulsionada pela Auditoria Cidadã da Dívida.

Com a suspensão dos juros e amortizações da dívida, o país terá condições de estruturar um efetivo plano emergencial de combate ao coronavírus, com ampliação de leitos e UTIs, equipes de saúde da família, reequipar os postos de saúde nos bairros, investir em equipamentos de segurança e nos salários dos profissionais de saúde, melhorar a instalação de unidades hospitalares e construir novos hospitais para evitar o colapso de se avizinha. Além de tudo, garantir renda básica para todos os trabalhadores informais e desempregados e dignidade à população em situação de rua. Esses investimentos devem ser combinados com uma efetiva quarentena nacional com licença remunerada para todos os trabalhadores que não estejam diretamente envolvidos nas funções de combate ao coronavírus ou abastecimento à população.

Corrente Socialista das Trabalhadoras e Trabalhadores-CST 

24/03/2020

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