Não ao ajuste, nem na Argentina nem em Cuba!

Por José Castillo, dirigente da Izquierda Socialista da Argentina/ UIT-QI.
24/12/2023.

Em Cuba, foi anunciado para 2024 o ajuste mais duro em décadas. Ele foi apresentado pelo Primeiro Ministro, Manuel Marrero Cruz, num discurso perante a Assembleia do Poder Popular, na presença do Presidente Miguel Díaz Canel e do líder histórico Raúl Castro.

Setores relacionados com o governo de extrema-direita de Milei, na Argentina, têm afirmado que “há ajustes em todo lugar, mesmo em Cuba”, para justificar o seu próprio ajuste anti-operário e anti-popular. Os porta-vozes de Milei argumentam que, enquanto aqui a “esquerda vai contra o ajuste”, “diante do ajuste de Cuba eles permanecem em silêncio”, porque, segundo o Clarín, para “a esquerda (…) esse é um ajuste justo e bom” (Clarín, 22/12/ 2023).

Não é o nosso caso. Nós, da Izquierda Socialista, queremos ser absolutamente claros: de fato, foi anunciado um plano brutal de ajuste em Cuba, que nós repudiamos, tal como o do nosso país. Não existem ajustes bons ou maus: todos atentam contra as condições de vida do povo trabalhador. Defendemos a luta contra tais ajustes e a sua derrubada.

Em Cuba não há socialismo

Javier Milei, repetidamente, tem denunciado o “socialismo” como responsável pela nossa crise. E tem dado Cuba como exemplo do socialismo e do seu fracasso.

Mas a realidade é que em Cuba não existe socialismo. Justamente por isso, há ajustes contra o povo. É o oposto do que dizem Milei e seus porta-vozes. A revolução socialista dos anos 60, que teve Che como Ministro da Indústria e que proporcionou grandes conquistas ao povo cubano (na saúde e na educação, para citar os dois exemplos mais conhecidos), gerando entusiasmo e solidariedade entre os povos explorados de todo o planeta, infelizmente foi derrotada. O capitalismo foi restaurado há anos e, infelizmente, todas as conquistas da revolução já não existem. Foram os próprios burocratas do PC cubano que levaram a cabo a restauração capitalista nos anos 90 e são eles que ainda hoje se beneficiam dela, como sócios das multinacionais que operam na ilha.

Em Cuba existe um governo ditatorial e capitalista, que reprime protestos e impede greves, tudo isso a serviço dos negócios acertados com as multinacionais do turismo, da especulação imobiliária e da exploração do tabaco, do rum e do níquel. As transnacionais chinesas, russas, canadenses, espanholas e de outros países da União Européia saqueiam as riquezas da ilha e super-exploram os/as trabalhadores/as do país, com salários miseráveis de apenas algumas dezenas de dólares.

Em Cuba há um ajuste capitalista e nós o denunciamos

O primeiro-ministro cubano, Marrero Cruz, claro, começou culpando o bloqueio ianque, que existe e sempre denunciamos. Mas não conseguiu esconder a responsabilidade principal, a do próprio governo do PC cubano, admitindo que “persistem insuficiências próprias e problemas subjetivos que afetam a capacidade dos programas e projeções econômicas”. A partir daí, Marrero Cruz anunciou o que chamou de “plano de estabilização econômica”, em linha com o que o presidente Miguel Díaz Canel chamou anteriormente de “economia de guerra”.

O argumento parece ser copiado do que ouvimos em nosso país, primeiro de Macri e depois de Milei. Marrero disse que o Estado não pode continuar com o desperdício dos subsídios à água, luz, gás, transportes e combustíveis: “não é justo que quem tem muito receba o mesmo que quem tem muito pouco. Hoje subsidiamos com o mesmo valor um idoso aposentado e o proprietário de grandes empresas privadas, que tem muito dinheiro”, afirmou sem pudor (Perfil, La Nación, França 24 em espanhol, 23/12/2023).

O concreto é que as medidas imediatas incluem um aumento de 25% na tarifa de eletricidade residencial, triplicação do custo do abastecimento de água e um aumento de 25% no preço do botijão de gás utilizado na ilha. Também foram anunciadas “novas tarifas” para o transporte público, o fim dos subsídios universais para alimentos básicos, listados num cartão de abastecimento cada vez mais restrito; aumentos nos preços de remédios e cigarros; e uma desvalorização do peso em relação ao dólar (atualmente a taxa oficial usada pelas empresas é de 24 cup [peso cubano] por dólar, mas para os cubanos comuns a taxa de câmbio oficial é de 120 cup, embora no mercado negro seja oferecida a 273). Como se não bastasse, foi informado que os salários dos/as trabalhadores/as das estatais serão congelados. Também foi comunicado um aumento do imposto sobre a compra e venda de bens, uma espécie de IVA, que atinge quem menos tem ao incidir diretamente sobre o preço dos produtos de consumo popular.

Não foi o primeiro ajuste. Medidas anteriores já haviam gerado fortes protestos nos dias 11 e 12 de julho de 2021, com milhares de cubanos saindo às ruas gritando “estamos com fome”, causando uma repressão feroz, que resultou na prisão de mais de 500 manifestantes que permanecem encarcerados até hoje (alguns deles com penas de até 25 anos).

Hoje, o novo e brutal ajuste contra as condições de vida do povo demonstra, mais uma vez, que em Cuba não existe socialismo ou algo parecido. O Partido Comunista Cubano continua a falar de “socialismo” para se justificar, mas governa com as multinacionais e com os novos-ricos do país. É algo semelhante ao que acontece na China, em que o Partido Comunista daquele país lidera uma das grandes potências capitalistas do mundo.

Há uma coincidência perversa entre Díaz Canel, Raúl Castro, o resto dos burocratas do PC cubano e os libertários de Milei: todos dizem que há na ilha o socialismo. Nós refutamos isso repetidas vezes. É uma mentira vulgar. Há o capitalismo, a exploração do povo trabalhador.

Nós, da Izquierda Socialista, denunciamos todos os planos de ajuste e os governos que os executam, independentemente da sua filiação política. Assim como enfrentamos e saímos às ruas contra o que Milei, de extrema direita, está realizando na Argentina, também dizemos que devemos denunciar o atual ajuste realizado por Díaz Canel e pelo atual governo capitalista cubano. Na Argentina, em Cuba e em todo o mundo: que a crise não seja paga pelos/as trabalhadores/as, mas por aqueles que a causaram e dela se beneficiam, os capitalistas, os banqueiros e as multinacionais! Lutamos pelo verdadeiro socialismo, que é a democracia do povo trabalhador, em que, em vez de negócios favorecendo as multinacionais, os banqueiros e a dívida externa, todos os recursos são colocados a serviço de uma economia planificada, que prioriza a solução das necessidades populares mais urgentes: salários e aposentadorias decentes; educação, saúde e habitação para todos/as.

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